quinta-feira, 12 de abril de 2012

A Guerra Civil da Marvel




Eu tenho que admitir que comecei a ler quadrinhos de super heróis tardiamente. Também abandonei o hábito precocemente. Acontece que, com certeza, as histórias em quadrinhos estão cada vez assumindo maior importância no desenvolvimento de novas formas de narrativa. Ao que me parece, existem duas pontas de lança na vanguarda das novas narrativas: os video-games e os quadrinhos.

Então, cansei de ficar só ouvindo sobre a tal Guerra Civil da Marvel e resolvi descobrir afinal o que foi isso. Meu primeiro ponto de interesse foi a proposta de multiplicidade feita pela gigante dos quadrinhos. A tal Guerra Civil, protagonizada pelo Homem de Ferro em oposição ao Capitão América, foi contada através de diversas revistas, dos mais diferentes heróis do selo. Algumas revistas se dedicavam mais ao tema da tal guerra, outras a tinham apenas como pano de fundo.

Fiz uma pesquisa em alguns blogs especializados e consegui uma lista com 102 revistas que seriam importantes para a compreensão da Guerra. Isso mesmo. 102. Eu não contei, mas podemos colocar aí uma média de 30 páginas para cada uma o que nos leva à uma saga de mais de 3000 páginas de quadrinhos.

Como eu disse, algumas delas são exclusivamente dedicadas ao evento, como a série Frontline, que acompanha a trajetória de dois jornalistas (portanto não super-humanos) que estão cobrindo a guerra. Na minha opinião, esta é uma das melhores partes da saga. Outras são próprias de super-heróis, como o Homem Aranha, bastante envolvidos com a Guerra. Há uma terceira linha de heróis que parece coadjuvantes no evento mas, de alguma forma, tiveram seu universo abalado pela guerra, ou desempenharam algum papel nos acontecimentos da mesma.

Não há um consenso entre os leitores sobre a melhor ordem para ler as tais 102 revistas. Isso é bastante interessante. A leitura que eu fiz foi baseada na ordem cronológica do lançamento do lançamento delas nas bancas. Entretanto, algumas estiveram disponíveis em datas bem próximas, ou mesmo em data comum. A possibilidade de ler a Guerra Civil da Marvel de diversos pontos de vista é uma mostra do potencial narrativo da obra.

Muitas vezes, as histórias estão escritas de forma deslocada cronologicamente, assumindo elipses de tempo que você só vai compreender totalmente quando fizer a leitura das demais revistas. Entretanto, dificilmente você ficará completamente perdido na trama se pular algumas delas (exceto alguns números chaves). Esta é uma habilidade narrativa bem interessante e moderna (no sentido que se está fazendo bastante hoje em dia). E a capacidade de usa-la dentro de um contexto que envolve 102 revistinhas diferentes mostra a excelência da Marvel em encadear histórias paralelas a partir de um mesmo eixo dramático.

Agora vamos à parte crítica. Talvez pelo fato de eu ter ficado tanto tempo longe das revistas de super-heróis, me surpreendi com a fraca dramaturgia adotada nessas histórias. A maioria dos personagens soa rasa e as escolhas e os conflitos de cada um acabam sendo resolvidos de uma forma muito fácil e brusca, sem progressão. No final das contas, acabei mais entretido pela forma como a história foi contada do que com o conteúdo em si.

Acredito que houve uma certa hesitação da Marvel para fazer a com que a Guerra Civil fosse mais densa. O principal conflito é causado pela morte de um sub-herói executada por um ciborgue que pensa que é o Thor. Quer dizer, dramaticamente um personagem inexpressivo no universo Marvel é morto por um robô que também não é o verdadeiro personagem do universo Marvel.

A tal Guerra Civil resume-se a dois grupos de heróis brigando sobre uma nova lei que o governo americano quer impor. Seria um pano de fundo excelente para mostrar, por exemplo, o racha no Quarteto Fantástico, um dos mais tradicionais grupos de heróis da Marvel. Mas, embora o tal racha aconteça e o Quarteto seja remodelado, o conflito entre personagens são mais fracos do que eles prometiam no início.

A própria solução da Guerra é muito fraca, quando um dos lados percebe as consequências daquela luta insana entre antigos aliados e a destruição que ela está causando. Como se isso não pudesse ter sido percebido antes. Sem falar do tempo e os conflitos gerados para que o Pantera Negra se posicione e, quando finalmente o faz, a guerra acaba, e fica aquela sensação de vazio.

A melhor trajetória de todas, durante a Guerra Civil, é, sem dúvida, a do Homem Aranha. Talvez por ser um personagem bem elaborado cujas alterações nas relações pessoais causam de fato impacto nele. Embora você faça uma ideia do que pode acontecer com Peter Parker, até a última revista do evento te surpreende.

O que pode ocorrer é que, ao espalhar através de tantas revistas a questão da Guerra Civil, a Marvel não conseguiu manter uma densidade apropriada para a história. Mas a minha opinião é que houve certo temor em relação ao próprio evento proposto, que em si já altera o Universo Marvel de uma forma sem precedentes. Isso tenta ser disfarçado na primeira revista da saga onde podemos ler trechos que seriam de uma conversa entre um redator hesitante e seu companheiro de trabalho na Marvel. Existiu uma preocupação de manter a maior parte dos personagens intactos, já que todo o mundo a volta deles estava mudando, fazendo com que não houvesse como aprofundar os conflitos dramáticos causados pela Guerra Civil.

Mas isso é o que eu acho. Os fãs adoraram. Fizeram até um trailer de um possível filme.